quarta-feira, 29 de julho de 2015

ECA: Estatuto da Criança e do Adolescente completa 25 anos


A violência contra a criança e o adolescente sempre esteve presente na sociedade e em diferentes classes sociais. No Brasil, um avanço importante para reconhecer crianças e adolescentes como cidadãos com direitos e deveres foi a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), criado pela Lei 8.069, e que em julho de 2015 completa 25 anos.

O ECA representa um marco jurídico que instaurou a proteção integral e uma carta de direitos fundamentais à infância e à juventude. Ele considera criança a pessoa até 12 anos de idade incompletos e adolescente aquela entre 12 e 18 anos de idade.

A lei estabelece: "É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária".

Ao todo, o estatuto tem 267 artigos que abordam diversos temas como o acesso a saúde e educação, proteção contra a violência e tipificação de crimes contra a criança, proteção contra o trabalho infantil, regras da guarda, tutela e adoção, proibição do acesso a bebidas alcóolicas, autorização para viajar, entre outras questões.

A criação da lei
Antes de 1988, o Brasil contava com o Código de Menores, documento legal para a população menor de 18 anos e que visava especialmente à questão de menores em “situação irregular”, de vulnerabilidade social. A visão tradicional da época era de que crianças e adolescentes eram incapazes e consideradas um problema para o Estado e autoridades judiciárias.

O ECA foi criado pouco depois da promulgação da nova Carta Magna, a Constituição Federal de 1988, também conhecida como “Constituição Cidadã”, por prever novos direitos fundamentais aos brasileiros.

A lei regulamenta o artigo 227 da Constituição, que garante os direitos das crianças e dos adolescentes: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Em 1989 houve a Convenção sobre os Direitos da Criança pela Assembleia Geral das Nações Unidas, ocasião em que foram discutidos compromissos internacionais que abriram caminho para as discussões do ECA no ano de 1990. O Brasil, então, tornou-se o primeiro país a adequar a legislação interna aos princípios consagrados pela Convenção. Ao longo dos anos, o Estatuto teve alterações introduzidas em eu texto, como por exemplo, a Lei de Adoção (2009), que acelera o processo de adoção e cria mecanismos para evitar que crianças e adolescentes fiquem mais de dois anos em abrigos.

Hoje o Estatuto é considerado um dos melhores do mundo, uma referência internacional em legislação para essa faixa etária e inspirou legislações semelhantes em vários países. Apesar disso, ainda hoje suas leis são desconhecidas pela maioria da população brasileira e em muitos municípios sua aplicação prática é descumprida.

Apesar de o ECA ter transformado a relação da sociedade com a questão dos direitos de crianças e adolescentes, ele ainda é ineficaz em diversos aspectos. Há muito que avançar nos direitos fundamentais assegurando a meninos e meninas uma educação de qualidade, assistência médica, moradia, alimentação, convivência familiar e comunitária, cultura, esporte, lazer, liberdade, dignidade e respeito.

Mudanças que a lei trouxe
Antes de o ECA ser promulgado, o Estado entendia que não havia diferença entre criança e adolescente. Também era comum ver crianças trabalhando ao invés de estudarem ou brincarem. O ECA contribuiu para que muitas mudanças acontecessem:

Reconhecimento de direitos: garantir que as crianças e adolescentes brasileiros, até então reconhecidos como meros objetos de intervenção da família e do Estado, passem a ser levados a sério e tratados como sujeitos autônomos. Hoje as crianças são vistas como cidadãos em desenvolvimento e que precisam de proteção.
Ensino: todo jovem tem direito a escola gratuita. E os pais são obrigados a matricular os filhos na escola.
Lazer: toda criança tem o direito de brincar, praticar esportes e se divertir
Saúde: crianças e adolescentes têm prioridade no recebimento de socorro médico, devem ser vacinados gratuitamente.
Políticas públicas de atendimento à infância e juventude: estabeleceu uma maior participação da sociedade civil, poderes públicos e dos municípios em ações de proteção e assistência social.
Proteção contra a violência: reconheceu a proteção contra a discriminação, violência, abuso sexual e proibição de castigos imoderados e crueis
Proibição do trabalho infantil: determinação da proibição de trabalho infantil e proteção ao trabalho do adolescente. A única exceção é dada aos aprendizes, que podem trabalhar a partir dos 14 anos com carga horária reduzida.
Conselho Tutelar: para cumprir e fiscalizar os direitos previstos pelo ECA, foi criado o Conselho Tutelar, órgão municipal formado por membros da sociedade civil. Atualmente 98% dos municípios contam com o apoio de conselheiros.
Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente: foram criados os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, que existem nas esferas municipal, estadual e nacional e têm como atribuição o monitoramento e a proposição de políticas públicas.
Novas regras para o adolescente infrator: foram definidas medidas socioeducativas para infratores entre 12 e 18 anos que precisam cumprir pena em unidades que visam à reeducação e a reintegração do jovem.
A polêmica da redução da maioridade penal
Um dos pontos mais criticados do ECA é a questão de como tratar o ato infracional praticado por menores. A maioridade penal é a idade mínima para uma pessoa ser julgada como adulto. No Brasil, essa idade é 18 anos. Se menores cometerem atos ilegais, a legislação que julga e decide a punição é o Estatuto, que possui artigos que se dedicam ao ato infracional.

A lei prevê que a menor idade de responsabilidade criminal é 12 anos. Entre 12 e 18 anos, estes jovens infratores devem ser atendidos por um sistema de justiça juvenil e com medidas socioeducativas que podem incluir internação em instituição para adolescentes. A pena máxima é de três anos.

Há quem considere a lei branda demais para punir adolescentes que comentem crimes ou infrações. Isso vem motivando um debate acalorado sobre a questão da redução da maioridade penal.

Em março de 2015, a Câmara dos Deputados retomou a discussão da PEC 171, projeto que propõe baixar de 18 para 16 anos a idade mínima para, em casos de crimes violentos, uma pessoa ser julgada pela Justiça Comum. O projeto ainda está em tramitação.

Defensores do ECA afirmam que o crime deve ser punido, mas é preciso considerar as diferenças no desenvolvimento físico e psicológico nos adolescentes em relação aos adultos. Para críticos, o Estado não é eficaz em recuperar o menor, e o ECA seria um instrumento que garantiria a impunidade em relação aos adolescentes em conflito com a lei.

Bibliografia
Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível online

ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente 9ª, Vários autores (DP&A, 2009)

Direitos Da Criança: Era Uma Vez..., A. Reis Monteiro (Almedina, 2010)

Carolina Cunha

Atualidades 2015- No Brasil, previdência é um desafio para o futuro



Como você imagina a sua renda no futuro? De 2009 para cá, o envelhecimento da população é uma tendência em muitos países e seu reflexo pode ser observado no consumo, mercado de trabalho, organização familiar e nos gastos do governo com saúde e previdência social.

Cada país pode ter o seu modelo próprio de previdência. No geral, o objetivo é o mesmo: garantir recursos financeiros à população mais velha ou que precisa de assistência e proteção quando esta se afasta do mercado de trabalho por diferentes motivos -- doença, invalidez ou idade avançada.

No Brasil a Previdência Social é um direito social assegurado na Constituição ao trabalhador registrado (há a opção privada, para qualquer indivíduo, em qualquer idade). A principal fonte de recursos para pagar as despesas da aposentadoria pública é a cobrança de um tributo em folha de pagamento.

Para manter o sistema em equilíbrio, o país precisa ter um número maior de pessoas no mercado de trabalho em relação ao número de beneficiados na previdência. Outra forma de equilibrar o sistema é alocar recursos para a previdência oriundos de outras fontes de arrecadação do governo.

Chama-se de deficit previdenciário o resultado negativo do cálculo a partir da diferença entre a arrecadação dessas contribuições e as despesas com os benefícios. Nos últimos anos, o Brasil acumula sucessivos deficits devido a um possível conjunto de fatores: a deterioração dos postos de trabalho, o emprego informal (sem carteira assinada), a má gestão dos recursos e o envelhecimento da população.

Em relação ao fator demografia, quanto maior é a expectativa de vida de uma população, maior é o gasto do governo com a aposentadoria dos trabalhadores. Uma pesquisa da ONU sobre Envelhecimento no Século 21 apontou que, entre os idosos, a segurança financeira representa a maior preocupação.

Nas últimas décadas, o Brasil viu sua população idosa aumentar em um ritmo mais rápido do que o previsto (devido à queda da fecundidade e ao aumento da expectativa de vida do brasileiro, que subiu para 74, 9 anos, segundo dados do IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Assegurar o bem-estar da população mais velha e equilibrar as contas da seguridade social é hoje um desafio para o futuro do país.

Atualmente o governo brasileiro alega que o sistema previdenciário não seria sustentável ao longo dos próximos anos. Para conter as despesas, o governo propôs endurecer as regras de acesso aos benefícios da previdência.

Em junho de 2015, o Congresso aprovou o mecanismo 85/95, que prevê mudanças no cálculo da aposentadoria. Com a nova regra, a soma da idade + o tempo de contribuição deve ser de 85 anos para mulheres e 95 anos para homens. A partir de 2017, o mecanismo será gradativamente acrescido em 1 ponto até 2022. Assim, em 2017 as idades passam para 86/96, em 2019 para 87/97, em 2020 para 88/98, até chegar em 90/100 em 2022.

A mudança gradativa foi uma decisão da presidente Dilma frente à proposta inicial aprovada no Congresso. O argumento foi que com o aumento da expectativa de vida, os gastos com aposentadoria dos idosos seriam acrescidos, elevando as despesas públicas e provocando um deficit previdenciário.

Hoje, a previdência consome 22,7% da despesa total do governo brasileiro. Uma pesquisa internacional apontou que os gastos previdenciários equivalem a 11% do PIB no Brasil e a 6% do PIB nos EUA, sendo que a proporção da população norte-americana acima dos 60 anos (16% da população total) é o dobro da brasileira (8% da população total).

Para especialistas, a valorização do salário mínimo -- que corrige os benefícios --, a aposentadoria precoce e o excesso de pensões são fatores que ajudam a elevar os gastos do governo com a previdência.

Por isso, equilibrar as contas públicas é um dos pontos centrais da mudança já que o Brasil viverá uma transição demográfica a partir de 2030, quando a previsão do IBGE indica que a população brasileira vai atingir seu pico e terá o maior número de pessoas trabalhando. A população jovem, entre 15 e 29 anos, deve cair muito a partir desta data.

Essa mudança de perfil na população torna urgente a discussão sobre o modelo de aposentadoria, já que os idosos de amanhã estão no mercado de trabalho hoje, e o governo precisa preparar seu orçamento para não ter o mesmo problema que países europeus, por exemplo.

A crise econômica da Europa não foi motivada por questões previdenciárias, mas esse item na despesa teve um peso considerável num cenário de alto endividamento público. Com um perfil de população mais velha -- visto como avanço e sinônimo de qualidade de vida -- os gastos sociais tornaram-se insustentáveis com a estagnação das economias desde 2009.

Um exemplo é a Grécia, ao lado da Itália, o país que mais gasta com previdência. Lá a renda em metade dos lares vem da aposentadoria e 45% dos aposentados vivem sob a linha da pobreza. Em meio à crise, a redução no valor pago às pensões, como exigem alguns, poderia reduzir os gastos, mas levaria a um aumento da população pobre e traria outros problemas ao país.

Toda essa discussão passa por garantir um bom envelhecimento e estabilidade aos mais velhos. Embora para uns a imagem de uma população mais idosa caracterize um país como frágil e incapaz, mudanças de comportamentos e novas tecnologias sugerem que não é bem assim.

Muitas pessoas preferem trabalhar mais que o tempo previsto, por exemplo, mesmo numa idade avançada. Muitos iniciam uma nova atividade para não ficarem parados. E será que gerações futuras vão desejar trabalhar mais tempo? Se sim, isso aumentaria o tempo de arrecadação do governo e a produtividade do país.

Ao longo da história, as mudanças demográficas criaram desafios importantes para as sociedades. Muitos países fizeram reformas, se adaptaram a novos cenários. Até 2030 o Brasil tem um curto tempo para definir como vai tratar a sua melhor idade.

BIBLIOGRAFIA
Artigo Previdência do trabalhador: uma trajetória inesperada, de Mariana Batich. 2004. Disponível online

O direito à velhice: Os aposentados e a previdência social, de Eneida Gonçalves de M. Haddad (Cortez; 2000)

Andreia Martins